sexta-feira, 1 de outubro de 2021

CLÁSSICO É CLÁSSICO: EM "O DISCRETO CHARME DA BURGUESIA", LUIS BUÑEL FAZ UMA CRÍTICA DEMOLIDORA AOS RICOS

     


        Cazuza não cantou á toa "A Burguesia fede...Enquanto houver burguesia não vai haver poesia".  Essa classe social vem sendo criticada faz tempo. Se é assim na música, no cinema não seria diferente. Foi o que fez o "pai do surrealismo" na sétima arte, o espanhol Luis Buñel em 1972 com "O Discreto Charme da Burguesia" ("Le Charme Discret de La Bourgeoisie", produção francesa).
    Com uma história que mistura sonhos (vários sonhos...) e realidade, Buñel conta a história de um grupo de ricos que "tenta" (isso mesmo, só tenta) marcar um jantar de confraternização, mas que, pelos mais absurdos/bizarros motivos, o encontro é cancelado ou adiado. Drama e  comédia também se misturam. Exemplos: Um jantar é adiado porque descobrem, após os pedidos já terem sido feitos ao garçom, que o dono do restaurante está sendo velado ao lado do salão.... Ou na casa de um dos personagens, quando já à mesa pra comer, a refeição é adiada porque uma tropa do exército entra na sala. Os soldados haviam sido convidados pelo anfitrião e resolveram "aparecer" naquela noite...
    O diretor faz diversas críticas sociais. O personagem principal é o embaixador do país fictício da República de Miranda, na América do Sul. O diplomata é traficante de cocaína que vende a droga para os endinheirados. Por isso, não pode nem ouvir falar em polícia.... Quem faz o embaixador é o excelente ator espanhol Fernando Rey. No jantar em que a tropa aparece, o comandante e alguns anfitriões fumam maconha...Aí oferecem para a mulher de um deles e ela recusa. O militar afirma que no Vietnã era "comum" comandantes e soldados americanos fumarem maconha. Ela responde: "Vai ver que era por isso que uma vez por semana bombardeavam as próprias tropas..."
    A igreja também não escapou: O bispo do local se oferece pra trabalhar de jardineiro na casa de um dos amigos do embaixador. Justificou dizendo que muitos padres defendiam operários e que não havia problema algum em eles se tornarem, também, trabalhadores braçais. Esse religioso carrega um trauma de infância na linha do "só Deus pode perdoar..."
     O terrorismo - um temor global também no começo dos anos 70 - não ficou de fora do filme. Uma jovem e bela terrorista passa parte da história perseguindo o embaixador/traficante...
    O jeito de ser, de viver e a decadência ("decadence avec elegance"...)  dos ricos são um prato cheio para Buñel num jantar que nunca acontece...
    "O Discreto Charme" ganhou o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 1973. Reconhecimento ao trabalho genial de Luis Buñel, que começou essa caminhada lá longe, em 1929, ao lado de outro gênio do surrealismo (mas nas artes plásticas), Salvador Dali. Juntos fizeram o filme "O Cão Andaluz".