Em 1981, o diretor Leon Hirszman lançou o filme "Eles Não Usam Black-Tie", baseado na peça de mesmo nome de Gianfrancesco Guarnieri. No elenco estão o próprio Guarnieri, Fernanda Montenegro, Milton Gonçalves, Bete Mendes e Carlos Alberto Ricelli. Entre os vários prêmios que ganhou no Brasil e no exterior, destaque para o Grande Prêmio do Júri do Festival de Veneza.
Um resumo bem resumido: É a história de um operário com a namorada grávida e, na empresa em que ele trabalha, começa uma greve. Com medo de perder o emprego (eles vão se casar...) o trabalhador decide furar a greve que é liderada pelo...pai dele!
Para a produção do filme, Hirszman e equipe viajaram ao ABC paulista que "fervia" com protestos e greves dos metalúrgicos em 1979. Encontraram por lá Santo André, São Bernardo e São Caetano "pegando fogo" com as manifestações por reposições salariais. Isso ainda "em plena" ditadura militar. Mas era um momento da anistia "ampla, geral e irrestrita", com a abertura política que começava...
Diante de tudo isso, o cineasta decidiu rodar um documentário além da produção de "Eles Não Usam Black-Tie". E historicamente isso foi importante. Ficaram registrados vários episódios das movimentações grevistas e das reuniões com representantes do governo federal.
O doc começa com a greve deflagrada em 14 de março de 1979, véspera da posse do último presidente do regime militar, general João Baptista Figueiredo. Cerca de 150 mil operários cruzaram os braços. Isso numa época em que toda assembleia reunia, pelo menos, 100 mil... 150 mil pessoas. Hoje, com ambiente democrático, liberdade de opinião, é praticamente impossível de se conseguir algo tão grandioso de uma categoria profissional...
As filmagens também destacam o maior líder sindical que surgiu no país na década de 70: Lula. O filme não é sobre ele, mas ele tem destaque - ao lado de outros sindicalistas - em alguns momentos. No trecho final, numa assembleia, depois de 60 dias de muitos protestos e 15 dias seguidos de paralisação, Lula propõe que os metalúrgicos voltem ao trabalho porque as reivindicações principais haviam sido conquistadas: Reposição salarial e a volta dos diretores do sindicato ao trabalho, já que eles tinham sido afastados por uma lei "de segurança" que havia na época.
Por causa disso tudo, Lula falou aos companheiros que lotavam o estádio em São Bernardo do Campo:
"Não adianta vocês entrarem em greve na segunda-feira e, dois dias depois, voltarem, de cabeça baixa, ao trabalho sem ganhar nada. Nossa pauta negociada vai ser conquistada com a gente na fábrica. E já conseguimos a volta da diretoria do sindicato."
Lula já sabia, naquela época, que pode "ser fácil" entrar numa greve. O "difícil" é sair dela...
Leon Hirszman não conseguiu concluir o documentário. Ele morreu em 1987. O trabalho foi terminado por parte da equipe dele em 1989.
E é, também, um material jornalístico fundamental que registra um momento importante do país que caminhava para a abertura politica.
Importante: "ABC da Greve" está disponível, de graça, no YouTube.
